Pneus e furos e cenas assim...

   Há lá coisa mais agradável do que um furo num pneu numa manhã cedo de 2ª feira? Talvez um enxerto de porrada ou uma dor excruciante de dentes ou de cabeça, no entanto, um furo é sempre um furo, implica desorganização na nossa vidinha formatada e para além dos skills técnicos necessários é sempre uma prova delicada para qualquer mulher nem que seja no seu amor-próprio. É que apesar de não ligar nenhum ao carro e a tudo o que a ele diga respeito, incomoda-me passar a ideia que sou uma tansa nos aspectos relacionados com o dito. Pensar no carro é aborrecido, tudo o que lhe diga respeito é um enorme bocejo: limpá-los, lavá-los (agrada-me viver numa ilha, normalmente a mãe natureza trata desse assunto por mim; para além de que tenho uma aranha com uma teia muito bem composta entre o espelho lateral direito e a porta e aborrece-me deixá-la sem casa), ver-lhe o óleo e a água ( quanto ao limpa para-brisas a chuva resolve o assunto pelo que só é reabastecido de água quando vai à revisão), controlar as idas à revisão (grosso modo depois do limite de quilómetros ultrapassados dou-lhe mais uns 3 mil, passo-lhe a mensagem que confio nele), à inspecção ( tenho medo dos inspectores, são sempre muito enigmáticos e não transparecem nada se vão chumbar o nosso carrinho e olhando para eles e para os seus rostos severos sinto sempre que algo de muito grave se passa com o meu carro!), até ter que parar na bomba para o encher de gasóleo de vez em quando ( normalmente abasteço quando já não há mais volta a dar, é até o limite do sensato, quando o ponteiro há uns tempos atrás está colado ao vermelho). Dedico ao carro a importância que têm as coisas de que não prescindo mas de que me aborrece ter que cuidar. Sou uma ingrata e o meu carrinho tem sido um instrumento fiel! 
   Um pneu furado em ida para a escola para deixar miúdos implica raciocínios complexos quando a cabeça ainda não está a funcionar a 100%; implica fazer previsões e imaginar potenciais cenários,  tomar decisões rápidas para que nem os putos faltem às aulas nem eu chegue atrasada à escola; hoje resolvi arriscar e fui, lenta como um caracol, com o pneu em baixo, a sentir todos os estremeções do carro em cada pedra de calçada e só pensava " que a jante não fique empenada e eu sem carro!". Rezei pelas alminhas que conseguisse ultrapassar aqueles intermináveis dois quilómetros. Depois, parei o carro numa sobra de estrada e respirando fundo joguei-me forte naquela empreitada. Quantos de nós vendo a pouca sorte dos outros quando o mesmo lhes acontece ou mesmo um acidente não pensam " pobre coitado, mas antes ele que eu!"
   Hoje era eu e nem pensar em armar barraca. Com o meu ar mais profissional desenhado nas ventas, de mulher claramente batida nestas andanças, com a postura corporal de quem faz aquilo todos os meses, lá comecei os procedimentos habituais com a maior dignidade possível. Penso que passei a imagem de quem domina o assunto na perfeição e de tal forma foi que um homem passou por mim no passeio e nem um " A senhora quer ajuda?!". Nada!!! Que frieza, que indiferença! Por um momento fiquei ofendida, que a gente gosta de algumas delicadezas ainda que seja para depois se responder com a expressão mais indignada que nos for possível desenhar no rosto " Não muito obrigado, tenho tudo absolutamente controlado!" Em certas situações as aparencias são fundamentais e penso que estive bem nesse departamento. Tudo corria sobre rodas até chegada a parte de desapertar as porcas. Malditas porcas... e estou a ser simpática com elas! Eu saltei, puxei, empurrei, pus o peso dos meus quase 70 quilos por cima da chave de porcas, utilizei os palavrões mais expressivos para ajudar a fazer força... até que surgiu uma questão de alguma importância: Afinal de contas para que lado é que se desenrosca uma porca, da esquerda para a direita ou da direita para a esquerda?! É que saber a resposta a esta pergunta faz toda a diferença! Telefona-se ao cunhado e pergunta-se: " Olha lá, uma questão simples, para que lado é que se desaperta a porca de um pneu?! Resposta rápida e consoladora. " 90% das vezes é da direita para a esquerda!" " Ok, passei os últimos 15 minutos da minha vida a fazer exactamente o contrário!" Lá está, questões  de lateralidade que em alguns momentos fazem alguma confusão para quem está habituado a fazer as coisas ao contrário. O meu carrinho que é italiano e portanto não deve ter essas manias de ser diferente como os ingleses deve ter as porcas a rodar para o lado certo, Deus me ajude!" E ajudou que, ultrapassada esta questão, foi em 10 minutos que o pneu foi mudado e que cheguei à justa à escola, contente por ter pedido ajuda e por ter perguntado o que não sabia; há alguns anos atrás, de nariz empinado, era bem capaz de estar, ainda, a desapertar as porcas para a direita; quem sabe conseguia, a perseverança (ou a estupidez) fazem milagres.

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