São Tomé - dia 1

   Este principio de dia seria sem história não fosse o meu parceiro nesta viagem ter tido o péssimo gosto de perder o avião, estando no aeroporto! Ou seja, as perspectivas de vir amanhã são de 60% segundo o funcionário da TAAG, gosto do pormenor do número sessenta, normalmente o pessoal quando lança um numero vai para os ímpares, 50% ou 75%. Se os 60% não se confirmarem passarei o Natal sozinha. 
   Tirando essa questão não sei muito bem por onde começar! À primeira vista a ideia é que nos estamos a aproximar da ilha de São Miguel. Depois repara-se que a vegetação é diferente e que a costa não é tão abrupta e  rochosa. E de repente surgem as praias com os seus tons de mar, azul e verde a confundirem-se. 
   O bafo quente e húmido é pungente e percebe-se que a terra é nova. Do teu lado direito vês uns ilhéus, os"Ilhéus das Cabras" dizem-te. 
   E depois, depois é um suceder de caos organizado, gente, motas, carros, jipes, crianças já vividas a tirarem-nos a pinta " Branca" e a pedirem. Primeiro moedas, respondo que não. Vem a caneta a seguir, antes a caneta que coisa nenhuma e aí já concordo. Falo com um, pergunto-lhe a idade, tem 18 anos, diz que anda no liceu, chumbou o 9º ano, pergunta-me como me chamo, respondo e e diz "Daí". E eu digo, "não dou" e ele insiste " Não , Daí é o meu nome! " E eu rio e ele ri-se e apertamos as mãos simplesmente. Levou uma caneta mas ter-lhe-ia dado muito mais. Mas não posso. 
   Os cães, infalivelmente ossos, só ossos, ou então de barrigas inchadas com parasitas. O primeiro que vi era um cachorro, brincalhão, ainda comecei neste meu hábito ocidental de penar por todos os bichos mas parei a tempo, uma freira que passou falou-me do que lhes fazem, maldades várias e resolvi que, por uma vez, iria desligar esse assunto e aceitar que nada posso fazer quanto a isso. 
   O Nuno veio-me buscar. O Nuno vai-nos alugar um jipe, grande como o demónio. Simpático, deu-me as indicações básicas para me orientar na cidade. Quando chegámos ao miolo o caos era completo com feirantes de rua a venderem tudo, e mais cães, invisíveis ao olho humano, ninguém lhes passa cartão, vivem de ar e vento. A prática de venderem nas ruas, diz o Nuno, até serem corridos pela polícia é coisa recente e trazido por africanos do continente. A certa altura diz-me ele que tem de ir buscar uma coisa, vira à direita e encontramo-nos na rua da casa do primeiro ministro. Sai do carro a dizer " tá a ver, qual o país onde o primeiro ministro está a nossa espera, é nosso amigo e anda pelas ruas como qualquer um?!" E lá estava o primeiro ministro da republica de São Tomé de boné tipo rapper, num jipito de segunda ordem na palheta com o tipo da agência de aluguer de automóveis. 
   O resto foi a Albergaria Porcelana que é toda em madeira, modesta mas decente e limpa com a Sónia Marlene, uma negra bonita de 37 anos e de riso fácil e alegre, mãe de 3 filhos e que me preparou uma omeleta com micocó (uma erva que usam para todos os fins culinários), cheia de piripiri e banana-pão frita. A acompanhar, a Rosema, cerveja leve São Tomense, garrafa de meio litro que minis é coisa que o pessoal de cá não conhece. 115 dobras custou o jantar e mais uma garrafa de água de Penacova. 1 euro são 25 dobras, o jantar ficou em menos de 5 euros. Dei-lhe 10, agradeceu gentilmente e já ficou reservado material para os filhos. No trato por tu, desde o início ao qual respondi da mesma forma, deu-me algumas indicações para saber lidar com a criançada, coisa que a Ana e a Anaísa, duas raparigas que cá estão tb hospedadas, do norte, também fizeram. "Vais ser chamada de branca, habitua-te! ". Estão cá há uma semana e tencionam estar mais uma. Dizem que, da próxima vez, não ficam hospedadas na cidade, é demasiado o caos, o lixo, a sujidade. Aconselham-me a sair, dão-me dicas sobre como sobreviver no transito, " se quiseres ultrapassar, tens de apitar e muito senão, as motas, verdadeiros kamikazes viram-se para ti e gritam "não há buzina?!!!!". É tudo ao contrário!". 

   Cheguei já de noite, com a emoção das luzes só vi a cidade na sua forma escura. 
   E já me coço, esqueci-me de besuntar a cara. Cheiro a uma espécie de desinfectante. Ainda não me picaram os pés, eu que sou atreita a todo o tipo de picadas de insectos. E os comprimidos para a Malária parecem estar a aguentar-se bem. Estou constipada, foi do banho de lua quase cheia. São 22 horas, mais duas que nos Açores, lá fora, nas ruas esburacadas o trânsito continua. Parece que este pessoal não dorme. Hoje não vou para lá passear, as ruas nem sempre têm luz, não me apetece aventuras. O Nuno diz que não há perigo, já me indicou os spots da moda. Não vim aqui pelos spots da moda. Por agora, só quero ver esse mercado de dia, se for como o vi de noite, a coisa promete.

   A Sónia Marlene continua a rir-se, a Ana e a Anaísa foram para lá meter-se com ela.

Sahara ??? 



Accra - Gana

Primeiro vislumbre


Ilhéus das Cabras


   

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