Curtas

   Num passeio noturno passámos, ali pela rua de Santo Espírito, por um grupo de turistas portugueses já entradotes na idade, ruidosos e bem dispostos. Cruzamos-nos com eles em frente da GNR, indo estes na direcção do Pátio da Alfândega e um deles, conhecedor, ia dando indicações quando se ouve uma senhora perguntar com aquele tom meio enjoado com que alguns, os das cidades grandes usam para falar da província:" Mas afinal de contas aquilo ali à frente é rio ou mar?". Pensei responder-lhe que era o rio Guadiana mas mordi a lingua pelo que lhe disse, ela já de costas " É o Oceano Atlântico, minha senhora, francamente!" Ela seguiu o seu caminho sem se sentir beliscada. Penso que ouvi gente a rir do dito espirituoso da senhora. Lá se foi aquela ideia que eu tinha que toda a gente com idade para pertencer à terceira idade sabia de cor e salteado, rios e afluentes de Portugal e Ultramar, linhas e estações de caminhos de ferro e outras minudências da geografia do nosso grande reino. E que não sabendo tinham algum pejo em revelar abertamente a sua ignorância. Uma coisa geracional, não sei! Mas, parece que nos dias que correm, é giro armarmo-nos em burros se produzir algumas gargalhadas. Hoje houve muitas pessoas a rirem, umas com ela e outras dela.


   Proponho um daqueles quadros electrónicos que passam letras luminosas, vermelhas, têm que ser vermelhas, pendurado a meia altura, virado para os funcionários dos correios de Angra do Heroísmo com os seguintes dizeres: " Não esquecer, IMPORTANTE, o que vieste cá fazer hoje? Qual a tua missão neste posto de trabalho? Muito bem, ATENDER O CLIENTE! Como se atende o cliente? Isso, carrega-se no botãozinho da vez e entra-se em diálogo com o cliente! Quando se faz isso? Estás lá perto, SEMPRE que houver, nem que seja só UM, cliente! Porquê? Porque estás ao balcão, e quem está ao balcão tem como missão prioritária, ATENDER o cliente! O que fazes se não houver cliente? Isso mesmo, presumes que está quase a entrar um cliente e para isso levantas a cabeça de tempos a tempos na direcção da porta que é SEMPRE por onde entra o cliente e não finges estar muito ocupado com alguma papelada que dizes ser importante mas NUNCA tão importante como ATENDER o cliente! Percebeste tudo? Então repete comigo, em voz baixa, Atender o cliente, atender o cliente,.........."

   O meu domínio do francês é absolutamente ridículo, o inglês desagradavelmente imperfeito ao ouvido, o espanhol é de fugir, é um português com sotaque, o que não vem a ser coisa nenhuma. Os meus três filhos que são dotados para as línguas, sempre que me ouvem falar em inglês, mandam-me calar ou pior ainda, agarram-se à barriga com convulsões de riso, perguntam-me em que dialecto estou a gaguejar. Não há como fazer-me respeitar neste domínio, fui ultrapassada pelos skills tecnológicos destes putos que aprenderam a falar e a escrever em bom inglês, simplesmente comunicando com outros miúdos através de jogos da internet pelo que, se mérito houve, no excessivo tempo em sedentarismo nos quartos, foi este. E no entanto, no que ao português diz respeito ainda sou minimamente respeitada. Escrever segundo o acordo quando a isso me obrigam (na escola, só na escola e somente nos documentos oficiais sujeitos a escrutínio e aprovação) e manter o antigo é bom. Temos que ver a cena de uma forma positiva. " Então diga lá, quantas línguas fala?!" Posso responder com orgulho na voz " Três" que falar 3 línguas é muito melhor do que falar só duas, duas é o trivial. Não se sai da mediania, duas línguas fala toda a gente. " Ai sim?! Então que línguas são?!" A resposta sai pronta: " Vejamos, domino o inglês (aqui esconde-se o facto de a oralidade ser grotesta), o português, o de antigamente, aquele que toda a gente insiste em falar, veja-se lá a teimosia e a outra língua, aquela muito semelhante ao português mas que não é o português, é antes uma espécie de esperanto para os países da lusofonia, com a graça de só ser falada em Portugal. Confuso?!" Já pertenço ao grupo dos poliglotas, não é para todos, caramba!

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