A palavra às crianças: retratos de uma professora


                                                                     I

Capacidade de atenção de uma turma do 5° Ano: Pessoal, vamos jogar o jogo da mosca ( jogo infantil/tradicional). A mosca é o último a saltar e define o comprimento do salto seguinte. Dois minutos depois um aluno " professora, posso ser a formiga?" " a mosca, a mosca" respondo. Mais dois minutos depois, outro " quero ser a abelha" " a mosca!" " ai pois é a mosca!" Mais à frente, um terceiro: " agora sou eu o mosquito!" . " ok, pessoal, afinal de contas não me posso queixar de falta de criatividade: podem ser o que quiserem! "

II

Na aula, uma turma do 5° ano, exercícios de progressão para o salto em comprimento. Um artista daqueles com resposta na ponta da língua, atrapalha-se na chamada (impulsão) antes do salto, várias vezes. " Meninos, chamada a dois pés ou a um?" resposta em coro " a um" " foi o que o vosso colega fez?" " não" . Logo diz este " eu faço a chamada com quantos pés quiser!" E pronto!!!

III

Estou a pensar que ontem uma aluna me chamou p.u.t.a e que se calhar nos tempos que correm é uma "profissão" a ponderar ... Já viram se ela comete a injúria máxima de me chamar "professora" ou mesmo "funcionária pública"? Nunca mais me levantava com a vergonha!


IV.


   Este meu filho mais novo surpreende-me tantas vezes. Hoje chegou-me com dois papeis da escola, enviadas pela professora de inglês, dizendo que precisam da nossa ajuda, dos pais, para a preparação de algumas actividades para o dia 21 de março, uma delas na confecção dos inevitáveis scones e outra na decoração de um chapéu. Ora,  confesso que a professora de inglês do Gui me começou a irritar um tanto quando proibiu o puto de fazer um teste escrito no dia em que este tinha ido a uma prova desportiva, tinha chegado encharcado e eu o  mandei para casa. É verdade que não sabia que havia teste, mas é certo que , para um criança que tem uma facilidade enorme no inglês, fala online com miúdos estrangeiros, não ia sentir-se intimidado com um teste. Foi para casa porque me parecer o mais correto. O que é certo é que não permitiu que fizesse o teste noutro dia e assim ficou. Não quis zangar-me, sou professora também, mas ficou uma certa decepção. Eu conheço-a, fui sua colega! E há coisas que não guardo, quando soube barafustei e ficou por ali. Hoje, lendo os papeis, disse sem me conter " Gui, não sei se a tua professora merece?!" Com um ar de infinita paciência e algo condescendente como se falasse com uma criança: " Porquê, por causa daquela coisinha? Vá lá mãe, dá-lhe outra oportunidade!"

  Sempre a aprender!

V. 



 Atingidos os 29 anos a dar aulas, é nesta terra que encontro desculpas para não fazer a aula do tipo " comprei um fato de treino novo, já fui ordenhar as cabras e não o sujei. Quero ver se continua assim" , " doi-me a perna, levei um coice dum bezerro" ou a variante " um cavalo pos-me a pata em cima do pé" ou a aficionada" tenho as costelas a doerem, fui pegado por um touro"! Nem a velhinha e criativa " esqueci-me" escapa; cá na terra é "desqueci-me" que sempre sai, um pouco, do lugar comum!


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