A praxe no meu ISEF

   Havia um gajo lá no ISEF que assumia a função do mais bera da comissão de praxes! O tipo tinha um corpo franzino e pequeno mas elástico e nervoso; um crânio loiro de cabelo à escovinha de certa inspiração militarista que intimidava. A deficiência em altura compensava com a forma como nos olhava, como aproximava o nariz da nossa cara e no olhar azul que se colava ao nosso. Um sargento de pelotão em potência, um bom actor nessa função de nos amedrontar, os 100 quase-putos do 1º ano do curso de 1985; Lembro-me que foi só um dia que começou por ser de ansiedade intensa mas que cedo acalmou.  O salão nobre recebeu-nos com um grupo deles perfilados no estrado fronteiro às bancadas; todos de ar gélido e  impenetrável. Nós, mavericks acabados de chegar, não sabiamos ao que vinhamos; sabiamos que iriam judiar de nós mas como, não faziamos ideia. Depois de ordenarem que nos descalçássemos só de um pé,  coisa que fizemos foram chamando por nós, um interrogatório à vista de todos, mas nada de verdadeiramente dramático nem especialmente humilhante; umas partidas meias chochas e inócuas que cumpríamos, alguns só de 100 almas porque não havia sequer imaginação ou refinamento na perversidade para todos; eram só umas coisinhas meias tansas de gravidade leve e consequências nenhumas, uns rabiscos na cara e uns cacarejos, após uma hora daquele aborrecimento em que o loiro perdeu por completo o viço e abreviou a cerimónia porque o bocejo dos caloiros era vergonhoso, viemos a descobrir que o nosso sapato tinha ido parar ao fundo do lago da entrada amarrado com os outros sapatos de todos os outros caloiros, o que veio a ser o momento alto de toda a cerimónia: desapertar atacadores molhados não foi fácil e ali se consumiu mais uma meia hora que se revelou o suficiente para que a comissão desse por encerrada as hostilidades sem perder toda a credibilidade;
   No dia seguinte ninguém se lembrava quem era caloiro ou veterano, no ano seguinte nem sequer me recordo se houve praxe; eu cá não fui praxante nem recordo a ocasião como sendo de especial importância; recordo-a porque faz parte das primeiras imagens do meu tempo universitário, não porque em mim deixasse marca de sentido algum! No fundo, no fundo, o pessoal do ISEF da altura achava que tinha que fazer alguma coisa para ir na onda do recrudescimento da praxe nos anos oitenta mas sem convicção nenhuma; tinham mais do que fazer... coisas bem mais interessantes, uma partidinha de futebol, de basquetebol ou de rugby até! A gente queria era jogar, uma merda de um jogo qualquer a sério, desses com árbitros e bolas e campos rectangulares. Reuniões de praxe, rituais elaborados, hierarquias complexas e trajes académicos?! What the fuck, are you kidding?! Até para descobrirmos uma cor para o nosso curso foi uma carga de trabalhos, estava tudo ratado, o castanho desprezado a um canto, ok, venha ele que não queremos fitinhas às riscas!

E foi assim....    Gente sã!

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